André Luan Nunes Macedo*
Resumo
O presente artigo é uma síntese de uma comunicação elaborada para o Encontro Regional dos Estudantes de Medicina no dia 15 de novembro de 2010 , no qual fomos convidados a explicar o debate a respeito do Consórcio Universitário, popularmente conhecido como o projeto “superuniversidade”. Nosso debate procura estabelecer três momentos: 1) apresentar o histórico das discussões sobre o consórcio; 2) explicar a essência deste novo projeto educacional; e 3) a possível relação da superuniversidade com as experiências internacionais da política universitária.
Diante do último ponto, é necessário explicar nossa perspectiva analítica. Ela se baseia numa metodologia que busca negar uma visão técnica de cada ponto específico dos documentos do projeto, uma vez que não se trata de um projeto já aprovado e que tem a possibilidade real de não acontecer, dependendo assim da garantia dos debates nos Conselhos Superiores e nos órgãos que constroem a democracia das instituições superiores. Afinal, deve-se situar a universidade pública brasileira nas mediações sociais que a influenciam, na sua relação com o poder público e a grande imprensa – principal formadora de opinião da sociedade.
1. Entre informações e desinformações: o primeiro ferimento à autonomia universitária
A primeira notícia sobre o consórcio universitário, metaforicamente intitulado pela mídia como “superuniversidade” foi publicada em 3 de agosto de 2010, conforme pesquisado no site de buscas www.google.com[1]. O debate sobre a concepção da “superuniversidade” só chegou ao Conselho Universitário da UFSJ (CONSU) em meados de setembro pelo professor e atual reitor, Helvécio Luis Reis. Segundo ele, tal projeto era uma “proposta autônoma” dos reitores idealizadores da proposta. No texto que nosso reitor buscou explicar os bastidores da construção, o primeiro encontro para formular propostas teria sido em meados de julho[2], já com a presença do Ministro Fernando Haddad. Ao apresentar a data sobre o encontro, havia uma dúvida a ser esclarecida. Para chegar ao encontro da formulação, por uma questão lógica os reitores já pensavam sobre o assunto em suas universidades e necessariamente já tinham discutido algo a respeito em seus fóruns, provavelmente na ANDIFES. Então, questionamos: em que data ocorreu a primeira reunião dos sete professores que compõem o consórcio (UNIFEI, UNIFAL, UFSJ, UFOP, UFLA, UFJF e UFV)? Segundo o professor, a primeira reunião para construir os pilares para a formulação de idéias em torno do projeto ocorrera no início do ano, especificamente em fevereiro de 2010.
A partir dessas informações, quando nos encontramos em uma reunião com os DCE’s que participariam da superuniversidade, em outubro de 2010, buscamos encontrar os pontos de contato nas informações divulgadas em cada instituição para os estudantes e, a partir desse movimento, encontramos algumas contradições em relação às informações fornecidas. Todos os outros DCE’s disseram que o Consórcio havia partido de uma proposta advinda do Ministério da Educação para as universidades de Minas Gerais, na qual a UFMG, por exemplo, se recusou a participar. Nesse sentido, detectamos uma possível incongruência em relação ao que foi dito pelo professor Helvécio, quando nos apresentou um projeto não idealizado pelo governo federal. Tal relação muito nos preocupa diante da conjuntura universitária atual, onde a política institucional vê excessivamente com bons olhos todas as propostas advindas do atual governo.
O primeiro questionamento quanto ao Consórcio parte dessa relação e do possível ferimento da autonomia da comunidade acadêmica em traçar os seus projetos através de uma discussão interna permanente, algo que não tem acontecido durante o debate sobre esse projeto. Mais uma vez, por uma questão lógica, os conselhos superiores em nada participaram da discussão, pois tal projeto já vem ao longo do ano sendo construído pelas lideranças administrativas das sete universidades. Por quê os reitores não quiseram compartilhar suas propostas com os Conselhos superiores? Por quê não houve um interesse em buscar novas idéias da base? Quando não se faz um movimento dialógico entre o representante executivo e os conselhos, não poderia-se dizer que tal medida é um ferimento a uma discussão mais democrática? Será que essa medida vinda de “cima para baixo”, tão elogiada pelo professor Helvécio[3] é saudável para a dinâmica de reflexão da universidade? E, para nós, diante dos fatos, surge um questionamento que deve ser destacado: se já havia uma discussão sendo feita anteriormente, por quê a mídia só publicou as primeiras notícias em agosto?
A partir da última questão levantada, gostaríamos de compreender a relação entre o papel da mídia na divulgação dos acontecimentos e sua relação com os reitores das sete universidades.
A questão que causou mais resistência entre os sete reitores foi a divulgação das informações na grande imprensa. O nome superuniversidade causou grande insatisfação por parte deles, na qual a nomenclatura “Consórcio” seria mais apropriada.Também se mostraram indignados com informações de que haveria um “superreitor” na Superuniversidade, algo que distorce a conotação dada para a “parceria” entre esses representantes, que estariam dispostos a promover um maior “dialogo social”, nas palavras do presidente da comissão de construção do Consórcio, Luis Cláudio Costa, reitor da UFV. Nesse sentido, haveria uma dicotomia entre as informações repassadas pela mídia e a “versão oficial” dos fatos divulgada pelos reitores.
No entanto, ao realizarmos a pesquisa na internet, vemos que os artigos publicados por diversos jornais, como Estado de Minas, Último segundo, etc. possuem declarações de reitores que até esclarecem, dentro do espaço da mídia, as nomenclaturas criadas pela imprensa para divulgar as informações sobre o Consórcio. Ironicamente, encontramos, dentro do site da UFSJ, na parte específica do Núcleo de Educação à Distância (NEAD) uma notícia do Estado de Minas[4] que continha uma declaração do reitor da UFV, esclarecendo não só a nomenclatura, mas explicitando os objetivos do Consórcio, que foram igualmente reproduzidos nos documentos oficiais entregues por eles próprios[5].
Dessa forma, não detectamos dicotomia alguma, e sim um auxílio dos veículos de informação para noticiar a opinião pública brasileira a respeito do projeto. A grande mídia auxiliou os próprios reitores a reproduzirem suas idéias, exercendo a função de formadora de opinião, independente da sua discussão ideológica na sociedade. A mídia exerceria, portanto, a função de construtora da realidade e de formação de consenso sobre o projeto. Não se encontra nenhuma discussão crítica na internet[6] sobre a concepção do projeto. Ou seja, o único discurso reproduzido é o discurso dos reitores, algo que atrofia uma discussão mais democrática. Portanto, se deve haver uma crítica quanto o papel da mídia ela é contrária à análise negacionista dos reitores sobre o seu papel, uma vez que só as autoridades puderam relatar sobre o processo, enquanto que os conselheiros, o movimento estudantil e a comunidade acadêmica, agentes sociais extremamente preocupados com a pauta, assumiram um papel secundário na divulgação sobre o consórcio até então que, desde julho vem trazendo à tona grandes debates no cenário universitário brasileiro e internacional[7].
Negar a mídia como uma dimensão analítica para a construção de uma opinião, como fez por parte dos reitores, é ir numa contramão à reflexão que a universidade pública deve fazer sobre a grande imprensa. A mídia tem um grande poder de mediação na sociedade, e certamente é necessário entender a reprodução de suas informações para saber como será o comportamento da sociedade quanto á construção do projeto. E, como vimos, quando exercitamos essa reflexão, percebemos uma falsa dicotomia entre o que foi divulgado na mídia e nos documentos entregues pelos reitores.
Não há divulgação oficial dos fatos. A análise sobre o consórcio deve ser feita pelo prisma metodológico da totalidade social, entendendo todos os atores afetados pelas decisões dos reitores, seja na comunidade acadêmica, entre os professores de escolas públicas, o governo federal, a justiça, etc.
[1] Realizamos essa pesquisa no dia 16 de novembro de 2010, às 01:49 AM. Procuramos na Web notícias a respeito do tema com a palavra-chave “superuniversidade”.
[2] “Decidimos levar essa ideia ao Ministro da Educação, Fernando Haddad, em reunião que aconteceu no dia 19/7, noticiada amplamente pela imprensa brasileira”. Trecho retirado do texto “Consórcio das universidades federais sul-sudeste de Minas Gerais” do professor Helvécio Luis Reis.
[3] Trecho que fala da sua decisão em tomar uma medida que se baseia nos aspectos jurídicos da universidade
[5] Assim foi divulgado no site www.universia.com.br . Com o artigo intitulado “Consórcio cria superuniversidade mineira :Projeto envolve sete federais e sairá do papel em 2011”, já percebemos uma consumação dos fatos por parte da imprensa, que favorece ideologicamente a consolidação do projeto, quando diz que em 2011 ele “sairá do papel”. Além disso, o site ainda permite que haja um posicionamento do reitor de Alfenas, estabelecendo algumas ratificações: "Não é um projeto de fusão das instituições, mas sim de interação. A iniciativa visa fortalecer o Ensino, a pesquisa, a extensão e a relação com o Governo Federal a partir da complementaridade", explica Paulo Márcio de Faria e Silva, reitor da Unifal. Segundo ele, a chamada superuniversidade não terá CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) único. "Haverá um colégio de gestores, cada um deles com seus respectivos conselhos universitários, o que preservará a autonomia das envolvidas", elucida.
[6] Quando procuramos no Google as palavras-chaves “superuniversidade crítica”, não há nenhuma referência a algum contraponto em relação ao consórcio. A proposta dos reitores é muito bem elogiada e em nada se difere daquilo que estão dispostos a realizarem. Ironicamente, mais uma vez, o que aparece através de início nessa pesquisa é uma notícia hospedada no blog do jornalista Luis Nassif, que apresenta também os objetivos do Consórcio.
[7] Segundo a divulgação
[6] Quando procuramos no Google as palavras-chaves “superuniversidade crítica”, não há nenhuma referência a algum contraponto em relação ao consórcio. A proposta dos reitores é muito bem elogiada e em nada se difere daquilo que estão dispostos a realizarem. Ironicamente, mais uma vez, o que aparece através de início nessa pesquisa é uma notícia hospedada no blog do jornalista Luis Nassif, que apresenta também os objetivos do Consórcio.
[7] Segundo a divulgação
* André Luan Nunes Macedo está graduando em História pela UFSJ e é representante do alunado no CONSU.
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